Translate

domingo, 11 de agosto de 2013

Navegantes incansáveis

O que faz esses navegantes/exploradores largarem tudo em direção ao mar? É uma questão de destino, ou, talvez necessidade. Quando estive na Bolívia, conheci de perto a história de um deles. Thor Heyerdalh, um norueguês que estudou exaustivamente o material arqueológico da Polinésia e do continente americano. Ele queria provar que os primeiros povos colonizadores da Polinésia tinham vindo da região dos Andes, entre Bolívia e Peru. Sem muito crédito, ele decidiu provar pessoalmente sua teoria. Em 1947 construiu um barco de pau-de-balsa (jangada índia pré histórica da América do Sul) e partiu numa expedição do Peru às Ilhas Tuamotu, na Polinésia, que durou 101 dias. A expedição Kon Tiki ficou famosa e virou um livro, que agora também virou filme. Na ânsia de provar sua tese, ele continuou fazendo várias escavações e outras expedições. Só que as antiguidades do período pré-inca, que tanto buscava, nunca foram encontradas. Tudo bem que esta teoria é meio maluca e depende de uma série de questões, como navegar a contravento, coisa que ele não fez na época. E como explicar que os Incas e os Maias chegaram a civilizações tão imponentes sem nunca terem utilizado o mar? Pois e´....... 

Em uma de suas expedições, Thor resolveu em 1970 construir um outro barco de totora (espécie de junco) com a ajuda de alguns descendentes Incas. Construíram o tal barco às margens do lago Titicaca, na Bolívia. A expedição se chamou Ra II, e chegou a Barbados depois de 2 meses e mais de 6000 km. Foi um sucesso e ele provou que, ao menos, barcos assim poderiam ter navegado com a corrente das Canárias pelo Atlântico na pré história. O fato é que vestígios de barcos como este foram encontrados na Polinésia e no Médio Oriente.

Um dos homens que o acompanhou na expedição Ra II em 1970 foi Demetrio Limanchi, um descendente Inca com quem conversei por horas no lago Titicaca. Ele e seu irmão, incansáveis navegantes, ajudaram o norueguês a construir o barco de totora com a técnica dos antigos Incas. Vestindo sua túnica vermelha de lã, típica dos Andes, simpático e sempre sorridente, Demetrio me contou como foi a famosa viagem. O barco da foto, de 12 metros, ele construiu sozinho e é uma réplica exata do que foi usado na expedição Ra II, na qual atravessaram o Atlântico entre o norte da África (Marrocos) e Barbados (no Caribe) em 57 dias. Como ele me disse, o barco dura até 3 meses em águas salgadas, sem se deteriorar, e 4 meses em águas doces. 

Aqui, Demetrio Limanchi me mostra orgulhoso a publicação original da expedição Ra II que saiu na revista National Geographic em 1971, com fotos que provam sua presença na viagem, ainda jovem. Demetrio é hoje o único sobrevivente da expedição! Na parede, fotos que mostram a construção do barco e as diversas fases da expedição pelo Atlântico. Em sua lojinha, que mantém às margens do lago, também há miniaturas de barcos de totora que ele faz para vender. Claro que eu comprei um barquinho, que hoje enfeita minha sala! 

Aqui, uma versão menor do barco de totora, ao lado da casa de Demetrio Limanchi, à beira do Titicaca.

Casas típicas dos antigos povos Incas, feitas de barro e telhado à base de totora e outros tipos de palha. A forma arredondada é para proteger do frio andino e seus ventos rigorosos.


Demetrio e sua mulher na porta da lojinha onde vende e conta orgulhoso a sua história e a de seu povo!

Ainda hoje diversos barcos feitos de totora navegam pelo lago Titicaca. Alguns são usados para pesca e outros para carregar alguns turistas curiosos que ali chegam para conhecer a vida do povo andino. Só não andei nesse aí porque estava muito cheio e, embora saiba nadar muito bem, não sou adepta a quebrar regras locais de segurança....

Thor Heyerdahl viveu até 2012, e com 87 anos ainda defendia suas teses malucas de que esses povos tão distantes tinham, sim, alguma coisa em comum. Pelo menos os barcos! O que tinham esses aventureiros, navegantes, estrangeiros de todos os continentes, que saíam ao mar a decifrar o desconhecido? São muitas perguntas ainda sem respostas. Ainda assim, Thor conseguiu mostrar para os incrédulos da época que o vasto oceano não era um limite instransponível, nem para as mais frágeis embarcações! E ele jamais teria conseguido atravessar o oceano sem a ajuda dos últimos descendentes dos Incas e seus barcos de totora!
Deixo aqui meu abraço e agradecimento ao último navegante da expedição Ra II, Demetrio Limanchi, que me permitiu tirar fotos de seus barcos de totora e contar aqui um pedacinho de sua história pelas águas. Adeus!


16 comentários:

  1. Sensacional este seu encontro com um descendente dos Incas, muito bacana esta experiência.
    Adoro seus relatos, suas andanças por lugares tão inusitados, diferentes, suas fotos sempre muito boas, parecem postais.
    Maravilha.
    Beijo pra você.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Maria Célia
      Foi uma experiência e tanto....Como não consigo ficar só admirando as belas paisagens, acabo conversando com todo mundo e descubro coisas que jamais encontraria em um folder turístico!
      Beijinhos

      Excluir
  2. Que bacanérrimo Bia. ADOREI!!!
    Beijuuss

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Tenho certeza que você iria ADORAR tudo isso Regina, de preferência ao vivo!!!
      Bjs

      Excluir
  3. How interesting. I had read about those ships made of reed. So interesting ---so sea-worthy... So glad that you bought a little one for your home. What great memories you will have.

    Hugs,
    Betsy

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Hi Betsy
      I've also heard about these expeditions by sea and, I confess, I've always been in love with those stories ....I keep my little boat carefully and it's always around to remind me!
      Big hug

      Excluir
  4. .

    .

    . e eu . que nasci num país . outrora de navegadores ou navegantes . que descobriram tanto e tanto do mundo inteiro . que deram novos mundos ao mundo . legendo esta página como uma exaltação . à qual me curvo e me prostro .

    .

    . sempre grato .

    .

    . um imenso beijinho .

    .

    .

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Tens razão Paulo

      Seu país é de navegadores que, incansáveis, saíram descobrindo o mundo! Espremido entre Espanha e o Atlântico, navegar era como respirar, uma necessidade intrínseca de fato!
      Um beijo e bons ventos

      Excluir
  5. Que interessante!!! Quero muito fazer esse passeio e viajar no tempo.

    Beijos

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Vai gostar muito Manu!
      Apareça quando quiser
      Bj

      Excluir
  6. Respostas
    1. Thanks Terri
      All that culture in Bolívia is interesting!

      Excluir
  7. Oh, wow! A post about the Norwegian viking Thor!:-)
    Have you seen that last movie about his trip with Kon Tiki?

    Great post Bia.
    Wish you a happy weekend:-) Hugs from north

    ResponderExcluir
  8. Hello Tania!!!

    No, I haven't seen this movie yet, but I read about it in a book, which the film was based. My interest increased after my trip to Bolívia, where I could see up close these boats made of 'totora' and their stories of expeditions by sea.
    As you are from Norway, you must have that Viking blood in your veins, aren't you?
    Have a nice weekend

    ResponderExcluir
  9. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir
  10. I'd like to see the movie. It is wonderful the technique to make totora boat has been passed down and still put to use. They look simple but charming.
    Thank you for sharing your great story!

    ResponderExcluir